Resumo do artigo
A saída fiscal definitiva encerra a condição de residente fiscal no Brasil e define a partir de quando o contribuinte passa a ser tratado como não residente pela Receita Federal. Para formalizá-la, é necessário enviar a Comunicação de Saída até fevereiro e a Declaração de Saída até abril do ano seguinte. Sem esses documentos, o contribuinte continua sendo tributado no Brasil, mesmo morando fora, e pode sofrer bitributação, pagando imposto de renda tanto aqui quanto no país de destino. Países com acordo de bitributação permitem compensar o imposto pago no Brasil; onde não há tratado, há dupla tributação. Saiba mais.
Neste texto, você vai entender se quem deu saída fiscal precisa declarar imposto de renda e se isso pode cancelar o CPF.
Você vai encontrar os seguintes tópicos:
• 1. Introdução: como funciona a tributação de brasileiros não residentes no Brasil?
• 2. O que é saída fiscal definitiva no Brasil?
• 3. Quem deixa o Brasil precisa enviar comunicação e declaração de saída à Receita Federal: veja os prazos e as consequências.
• 4. Saída fiscal definitiva: 4 principais obrigações que você precisa cumprir para evitar bloqueios e irregularidades.
• 5. Saída fiscal e dupla tributação: o que muda quando o país de destino tem ou não tem acordo com o Brasil?
1. Introdução: como funciona a tributação de brasileiros não residentes no Brasil?
A saída fiscal definitiva do Brasil é um divisor de águas na vida de qualquer empresário, investidor ou profissional que decide mudar sua residência para o exterior.
Ela é o marco legal que encerra a condição de residente fiscal no país e estabelece a partir de qual momento o contribuinte passa a ser tratado como não residente pela Receita Federal.
Esse processo exige duas etapas fundamentais:
1. Comunicação de Saída Definitiva (CSD), a ser entregue até o último dia útil de fevereiro do ano seguinte à saída (possui natureza declaratória, conforme COSIT nº 133/2024 e COSIT nº 207/2024); e
2. Declaração de Saída Definitiva do País (DSDP), que deve ser apresentada até abril ou maio do ano seguinte. É o mesmo prazo para entregar a declaração do imposto de renda da pessoa física para que seja recolhida a “quota única”, conforme escreve Bruno Fajersztajn e Camila R. Nasser Cabral.
Para exemplificar, imagine que o investidor tenha informado em sua Comunicação de Saída Definitiva que deixou o Brasil em 30 de março de 2024 (corte temporal). A partir dessa data, considera-se encerrada a sua condição de residente fiscal no Brasil.
Sendo assim, ao apresentar a Declaração de Saída no ano seguinte (2025), ele deverá informar, na declaração do imposto de renda da pessoa física aqui no Brasil (“DIRPF”), todos os rendimentos e bens que possuía até o dia 30 de março de 2024.
• Se ainda nesta data (ou antes desta data) de 30 de março de 2024 o investidor possuía um imóvel aqui no Brasil, esse imóvel (patrimônio) deverá constar na DIRPF;
• Porém, caso o imóvel seja vendido em outubro, já após a saída, a venda deste imóvel será tratada de forma distinta: o ganho de capital, proveniente desta venda, não será declarado como se o investidor fosse residente aqui no Brasil, mas sim como não residente, devendo recolher imposto pela regra específica aplicável a estrangeiros.
Isto posto, a data que você coloca na comunicação de saída definitiva é um corte temporal e na prática funciona da seguinte forma:
“Funciona como um “31 de dezembro antecipado”: o patrimônio é congelado na data da saída. No caso do nosso exemplo acima, entre 1º de janeiro e 30 de março, o contribuinte ainda é tributado como residente no Brasil, com base na universalidade de rendimentos. A partir de 1º de abril, qualquer valor recebido (aluguéis, salários, dividendos ou aplicações financeiras) passa a ser considerado rendimento pago a não residente, sujeito à tributação exclusiva na fonte. Além da mudança de regime, esse enquadramento pode trazer efeitos positivos. Em diversas situações, a tributação para não residentes é mais vantajosa. Por exemplo: aluguéis que, como residente, seriam tributados até 27,5%, passam a ser taxados a 15%; algumas aplicações financeiras, antes tributadas, podem ser isentas para não residentes.”
Essa realidade é especialmente visível no universo dos atletas profissionais.
Quando um jogador como Neymar se transferiu para o Barcelona (2013–2017) e, depois, para o Paris Saint-Germain (2017–2023), a necessidade de formalizar a saída fiscal era necessária para evitar que a Receita Federal continuasse a exigir IRPF (imposto de renda de pessoa física) sobre salários recebidos no exterior.
O mesmo raciocínio já foi aplicado em precedentes do CARF. No caso do jogador Diego Souza Gama Silva, que atuava no Japão a partir de 2006, a ausência de comprovação de não residência levou a Receita Federal a enquadrar rendimentos e movimentações financeiras como omissão de receita:
“Confronto dos saldos – não residência fiscal
t. O acórdão recorrido ainda afirma que um dos motivos para a desconsideração do mútuo é a falta de informação do crédito relativo ao mútuo na DIRPF do credor nos anos calendários de 2007 a 2009.
u. No entanto, o filho do recorrente já não era mais residente fiscal no Brasil desde 01.02.2006, conforme Declaração de Saída que instruiu a impugnação, e, por essa razão, não estava obrigado à entrega da DIRPF no período autuado.
v. Prova deste fato são os contratos de trabalho com clubes no exterior constantes no processo.
w. Desde o começo do ano de 2006, o jogador Diego possuía contrato de trabalho com clube de futebol no Japão. Portanto, resta claro que, nos anos em análise, o jogador Diego já não era residente fiscal no país.
x. Não sendo residente fiscal, não está sujeito às obrigações acessórias de um residente, razão pela qual não é possível confrontar o saldo de mútuo informado na declaração do recorrente, com a DIRPF de seu filho, pois, à época dos fatos, este já era não residente fiscal no país. (CARF - RECURSO VOLUNTARIO: 19515 .722893/2012-18 2401-007.134, Relator.: MATHEUS SOARES LEITE, Data de Julgamento: 06/11/2019, Data de Publicação: 29/11/2019)”
Isso se aplica também em outro precedente no caso de um jogador de futebol que estava jogando na china: “Assim, sejam os rendimentos decorrentes ou não de vínculo empregatício, considerando que o Acordo para evitar bitributação celebrado entre o Brasil e a China revoga ou modifica a legislação interna, entendo que merece acolhida o pleito recursal, pois há que se reconhecer a condição de residente na China no curso do contrato celebrado, o que afasta a tributação no Brasil dos rendimentos oriundos do exterior (CARF - RECURSO ESPECIAL DO PROCURADOR: 18470.728514/2014-66 9202-007.322, Relator.: PEDRO PAULO PEREIRA BARBOSA, Data de Julgamento: 25/10/2018, Data de Publicação: 07/01/2019).
Portanto, não formalizar a saída fiscal gera riscos como:
• Continuidade da tributação no Brasil mesmo residindo no exterior;
• Autuações fiscais e risco de enquadramento criminal por sonegação.
Agora que te dei um panorama geral, iremos conceituar tecnicamente alguns conceitos, que é uma das propostas deste artigo.
2. O que é saída fiscal definitiva no Brasil?
A saída fiscal definitiva é o ato jurídico que encerra, perante a Receita Federal, a condição de residente fiscal no Brasil.
Ela marca o momento em que o contribuinte deixa de ser tributado pela regra da universalidade de rendimentos — isto é, todos os seus ganhos, dentro e fora do país — e passa a ser enquadrado como não residente (ou investidor não residente - INR), sujeito a incidência de imposto de renda retido na fonte, conforme doutrina especializada:
“Frederico Bastos, Iago Granito e Carolina Delgado:
Sendo residente no Brasil, a pessoa física estará sujeita à tributação de todos os rendimentos, independente de sua denominação, localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, bastando, para a incidência do imposto, o benefício do contribuinte. Por outro lado, sendo não residente no país, a tributação ocorrerá na fonte sobre rendimentos, lucros e ganhos de capital auferidos no Brasil, estando fora do campo de incidência do Imposto de Renda eventuais outros rendimentos auferidos no exterior.[...] Tanto é que a Declaração de Saída Definitiva do País exigida pelo artigo 14, caput do Decreto nº 9.580/2018 exige somente os rendimentos e os ganhos de capital percebidos no período de 1º de janeiro até o dia anterior à data da saída do País, visto que, após a caracterização como não residente, a tributação ocorre na fonte quanto aos rendimentos produzidos no país somente.[...] Portanto, no caso do residente brasileiro que realiza a saída fiscal definitiva ao longo do ano, torna-se é defensável que a data-base da apuração tributária relacionada aos lucros auferidos pela entidade controlada no exterior deva corresponder somente ao período proporcional enquanto o contribuinte figura como residente no país, não estando mais sujeito à tributação no Brasil os lucros apurados a partir da data em que o contribuinte for caracterizado como não residente. (Planejamento Patrimonial e Sucessório: controvérsias e aspectos práticos. Vol. III. “Saída definitiva do Brasil e a tributação dos lucros de entidades controladas no exterior”. São Paulo: Editora Dialética, 2025, E-book).”
É importante destacar que a saída fiscal:
• Não implica perda de cidadania brasileira (o passaporte continua válido);
• Não significa cancelamento do CPF;
• Tampouco afeta a titularidade de bens ou investimentos no Brasil, que podem ser mantidos, mas sob regime fiscal diferenciado.
A base normativa está na Instrução Normativa RFB nº 208/2002, em especial nos artigos 2º e 3º, que definem as hipóteses em que uma pessoa física é considerada não residente:
• Quando se retira do país em caráter permanente;
• Quando permanece no exterior por mais de 12 meses consecutivos; ou
• Quando apresenta a Comunicação e a Declaração de Saída Definitiva.
3. Quem deixa o Brasil precisa enviar comunicação e declaração de saída à Receita Federal: veja os prazos e as consequências.
A saída fiscal definitiva no Brasil não ocorre de forma automática: ela precisa ser formalizada perante a Receita Federal por meio de dois documentos distintos, que cumprem funções complementares:
• Comunicação de Saída Definitiva (CSD): Todos os rendimentos e ganhos de capital, sejam de fonte nacional ou estrangeira, estão sujeitos à tributação no Brasil. A residência fiscal decorre de critérios objetivos e subjetivos, como permanência estável no território nacional ou intenção de manter-se vinculado ao país [6], conforme dispõe o art. 2º da Instrução Normativa RFB nº 208/2002, o art. 70 do CC/2002, e a interpretação dada pela Receita Federal na Solução de Consulta COSIT nº 169/2016 [7] e COSIT nº2999/2014.
A CSD deve ser entregue até o último dia útil de fevereiro do ano seguinte ao da saída (art. 11-A, I, IN RFB nº 208/2002). Trata-se de uma obrigação de natureza meramente informativa, que não substitui a declaração de ajuste anual.
O seu objetivo é comunicar à Receita Federal a data em que o contribuinte deixou o Brasil em caráter permanente, bem como atualizar informações sobre:
• Data da saída fiscal definitiva no Brasil;
• Dependentes que também deixaram o país;
• Novo país de residência fiscal.
Outro documento que deve ser entrega para a receita federal para regularizar a saída fiscal do país é a:
• Declaração de Saída Definitiva (DSD): A partir desse momento, todos os investimentos e rendimentos no Brasil passam a ser tratados como de um investidor não residente.
A DSDP deve ser entregue no mesmo prazo da declaração do imposto de renda da pessoa física, geralmente até abril ou maio do ano seguinte à saída (art. 9º, I, IN RFB nº 208/2002).
A título de complemento:
“Bruno Fajersztajn e Camila R. Nasser Cabral:
[…] foi instituída a CSDP, que compreende um formulário eletrônico disponibilizado pela RFB para que a pessoa física informe a data exata da perda do status de residente fiscal brasileira e tenha tempo hábil para recolher os dados necessários ao preenchimento e entrega da DSDP e quitação do Imposto de Renda porventura devido, de acordo com as disposições aplicáveis a residentes fiscais, até sua data de saída.”
“Barbara Claire Guarinão:
Esta declaração substitui a modalidade Declaração de Ajuste Anual e deve conter informações sobre todos os bens, direitos e obrigações do contribuinte até a data da saída.”
4. Saída fiscal definitiva: 4 principais obrigações que você precisa cumprir para evitar bloqueios e irregularidades.
Com a saída definitiva do brasil, as principais consequências são:
• As contas bancárias precisam ser convertidas em contas de não residente. Normalmente será uma conta de investimentos (“Conta 4.373”) e uma conta corrente de Domiciliado no Exterior (“CDE”);
• Caso desempenhe atividade empresária no Brasil, há obrigatoriedade de nomear procurador no Brasil para a Receita Federal;
• Comunicar a condição de não residente às fontes pagadoras (bancos, corretoras, empresas);
• Sócio não residente não pode participar de empresa no Simples Nacional (empresa não pode se beneficiar do simples nacional).
5. Saída fiscal e dupla tributação: o que muda quando o país de destino tem ou não tem acordo com o Brasil?
Além dos riscos já destacados, pode ocorrer uma bitributação (os mesmos rendimentos podem ser tributados nos dois países).
Imagine um engenheiro que se muda em caráter permanente para a Austrália [10] em janeiro de 2024, mas não entrega a Comunicação de Saída nem a Declaração de Saída Definitiva.
• Para a Receita Federal, ele continua sendo residente fiscal brasileiro, devendo tributar no Brasil seus salários recebidos no exterior;
• Para a Austrália, ele é residente fiscal australiano, obrigado a tributar lá os mesmos rendimentos;
• Como não há tratado de bitributação entre Brasil e Austrália, ele arcará com dupla carga tributária, sem compensação automática.
Existem países com os quais o Brasil celebrou acordos de bitributação.
Esses tratados internacionais têm como objetivo evitar que a mesma renda seja tributada duas vezes, permitindo que o imposto pago no Brasil seja compensado no país de residência.
Isso significa que, se um rendimento de fonte brasileira sofre retenção de IR na fonte (como aluguéis, à alíquota de 15%) aqui no Brasil, esse valor pode ser utilizado como crédito tributável no exterior.
Existe uma lista de países que o brasil possui este tipo de acordo para evitar a dupla tributação.
FAQ - perguntas e respostas sobre mudança de residência fiscal fora do país:
Como devo tributar se moro no exterior e recebo aluguel no Brasil?
Os aluguéis recebidos no Brasil por quem mora no exterior são tributados com imposto de renda retido exclusivamente na fonte à alíquota de 15%, conforme o art. 744 do Decreto nº 9.580/2018 (RIR/2018) e art. 35 da IN RFB nº 208/2002.
O locatário ou a administradora do imóvel é responsável por reter e recolher o imposto por meio do código DARF 9478.
Quem sai do Brasil continua obrigado a entregar a declaração anual de imposto de renda?
Sim, mas apenas referente ao período em que ainda era residente fiscal no Brasil.
Após a saída fiscal definitiva, o contribuinte deve apresentar a Declaração de Saída Definitiva do País (DSDP), conforme o artigo 9º da IN RFB nº 208/2002, que substitui a declaração de ajuste anual do imposto de renda da pessoa física.
Nessa declaração, devem constar todos os rendimentos, bens e direitos existentes até a data da saída, recolhendo-se em quota única o IR eventualmente devido.
A partir da caracterização como não residente, o contribuinte não está mais obrigado à entrega anual da DIRPF, e seus rendimentos de fonte brasileira passam a ser tributados exclusivamente na fonte, conforme as regras aplicáveis a estrangeiros.
Como funciona a conta 4.373 e a Conta de Domiciliado no Exterior (CDE)?
A conta 4.373, regulamentada pela Resolução CMN nº 4.373/2014, é destinada exclusivamente a investimentos no mercado financeiro e de capitais brasileiro, oferecendo regime tributário especial, inclusive isenção de IRRF sobre ganhos de capital em renda variável para investidores estrangeiros, conforme o artigo 88 da IN RFB nº 1.582/2015.
Já a Conta de Domiciliado no Exterior (CDE) é uma conta corrente transacional, usada para recebimentos, pagamentos e remessas internacionais, sujeita à tributação normal de IOF-Câmbio e IR conforme a natureza da operação.
Quem mora no exterior e não formaliza a saída fiscal pode ser tributado no Brasil?
Sim. Enquanto a saída fiscal definitiva não for formalizada, o contribuinte continua sendo considerado residente fiscal no Brasil.
Nessa condição, a Receita Federal pode exigir o Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) sobre salários, aluguéis, dividendos e lucros auferidos fora do país, além de aplicar multas e autuações.
NOTAS
1. [...] Nesse sentido, pode-se afirmar que as pessoas físicas residentes no Brasil são tributadas com base no princípio da universalidade, segundo o qual a norma tributária, apesar de editada internamente, alcança situações ocorridas além dos limites do território estatal, sob o fundamento de as pessoas que realizam as situações tributáveis estarem conectadas ao Brasil em decorrência de sua residência fiscal. Segundo afirma Schoueri, os sistemas jurídicos que adotam a residência como elemento de conexão encontram em comum um sistema de tributação em bases universais (world-wide income basis), no qual os residentes de um país ficam sujeitos à tributação de todos os rendimentos, tanto de fonte interna, quanto de fonte externa, independentemente da localidade da renda. [...] A Instrução Normativa RFB nº 208/2002 dispõe que a pessoa física residente no Brasil que se retire do território nacional em caráter permanente deve apresentar a Comunicação de Saída Definitiva do País (“CSDP”) a partir da data da saída e até o último dia do mês de fevereiro do ano-calendário subsequente. Nesses casos, a Receita Federal já se manifestou por meio da Solução de Consulta RFB nº 169/2016 no sentido de que “a pessoa física que se retira do país em caráter permanente e apresenta a Comunicação de Saída Definitiva do País dentro do prazo é considerada como não residente no Brasil na data de sua saída”. Autores: Frederico Bastos, Iago Granito e Carolina Delgado. (Planejamento Patrimonial e Sucessório: controvérsias e aspectos práticos. Vol. III. “Saída definitiva do Brasil e a tributação dos lucros de entidades controladas no exterior”. São Paulo: Editora Dialética, 2025, p. 365, E-book).
2. [...] de acordo com o que determina o artigo 9º, incisos I e II, da IN RFB nº 208/2002, há o dever de apresentação da Declaração de Saída Definitiva do País (“DSDP”) relativa ao período em que permaneceu residente fiscal no Brasil no ano-calendário da saída, bem como o de se recolher, em quota única, o Imposto de Renda porventura apurado e os demais créditos tributários ainda não quitados. Tem-se, portanto, que, enquanto a CSDP formaliza a saída do Brasil em caráter permanente, a DSDP corresponde à declaração de imposto de renda referente ao período em que a pessoa física permaneceu como residente fiscal brasileira. Vale registrar que, pelo teor do artigo 3º, inciso II, da IN RFB nº 208/2002, a condição de não residente é adquirida com a CSDP, sendo a DSDP uma consequência da aquisição da condição de não residente. A falta de envio da DSDP resulta em sanções pelo descumprimento dessa obrigação acessória, mas não tem o condão de afastar a condição de não residente, a qual, como exposto, é vinculada ao envio da CSDP, apenas.
3. Como complemento: Esse mesmo entendimento pode ser observado em outras manifestações do CARF sobre a matéria, como no acórdão nº 2003-006.243, de 29.1.2024, em que se analisou caso de pessoa física que deixou o Brasil para residir no Japão sem ter apresentado a DSDP, mas que, em razão da apresentação da DAA, foi considerado residente fiscal brasileiro por parte das autoridades fiscais. Mais uma vez, em razão das provas produzidas, o CARF decidiu que, em que pese não ter sido apresentada a DSDP no momento de saída do Brasil, a comprovação de ausência nos 12 meses subsequentes, a autuação em questão foi indevida, sendo o preenchimento da DAA tratado como mero erro de declaração. Destas manifestações, pode-se concluir que o envio de DAAs por não residentes não tem condão de torná-los residentes no Brasil, o que está correto, eis que a condição de não residente é definida a partir da saída do país em caráter definitivo e do cumprimento de outra obrigação acessória, que é a CSDP. LIBERTUCI, Elisabeth. Pré-Textuais In: LIBERTUCI, Elisabeth. Manual do Brasileiro no Exterior - Ed. 2025. São Paulo (SP):Editora Revista dos Tribunais. 2024. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/doutrina/manual-do-brasileiro-no-exterior-ed-2025/3476672439. Acesso em: 4 de Outubro de 2025.
4. Portanto, não formalizar a saída fiscal gera riscos concretos que vão muito além de um simples descuido burocrático. O primeiro impacto é a possibilidade de suspensão do CPF, o que automaticamente paralisa operações financeiras básicas, como movimentação de contas, investimentos e até transferências internacionais. As instituições bancárias exigem que a conta seja convertida em conta de não residente, e a falta dessa adequação coloca o contribuinte em situação irregular.
No âmbito societário, os reflexos também são imediatos. Quando um sócio passa a ser considerado não residente, a empresa da qual participa não pode permanecer enquadrada no regime do Simples Nacional, obrigando uma reestruturação tributária que pode comprometer todo o planejamento societário familiar ou empresarial.
Além disso, enquanto não houver a formalização da saída, o contribuinte continua sendo tratado como residente fiscal no Brasil, sujeitando-se à tributação sobre a universalidade de seus rendimentos — mesmo aqueles integralmente auferidos no exterior. Esse detalhe tem levado muitos brasileiros a sofrer autuações vultosas.
E o risco não se limita à esfera administrativa. A omissão da saída fiscal pode caracterizar sonegação tributária, e o simples pagamento posterior do imposto devido não extingue a responsabilidade penal. Diferentemente do que muitos pensam, não existe a figura da confissão eficaz no crime contra a Fazenda Pública: uma vez constatada a fraude, o contribuinte pode ser responsabilizado criminalmente, ainda que regularize a dívida depois.
5. O indivíduo formaliza sua saída fiscal mediante a Comunicação de Saída Definitiva (CSD - art. 11-A da IN nº 208/2002) e a Declaração de Saída Definitiva (DSD – art. 9º da IN nº 208/2002), nos termos do art. 14 do Decreto nº 9.580/2018.
6. Requisitos objetivos e subjetivos: A caracterização da saída fiscal definitiva no Brasil depende da conjugação de requisitos objetivos e subjetivos, previstos na Instrução Normativa RFB nº 208/2002 e aplicados pela Receita Federal em soluções de consulta e fiscalização.(i) Requisitos Objetivos: O critério mais claro é o tempo de permanência fora do Brasil. A legislação estabelece que a ausência do país por mais de 12 meses consecutivos caracteriza a condição de não residente. Nessa hipótese, ainda que o contribuinte não tenha formalizado a Comunicação ou a Declaração de Saída, a Receita pode enquadrá-lo como não residente a partir do 13º mês. Esse requisito funciona como parâmetro automático: se alguém deixa o Brasil em caráter provisório, mas ultrapassa os 12 meses sem retorno, o vínculo fiscal com o país se encerra, ainda que os trâmites burocráticos não tenham sido observados. (ii) Requisitos Subjetivos: além do tempo, a Receita Federal avalia a intenção definitiva de residir no exterior. Esse critério subjetivo é conhecido como “ânimo definitivo”, expressão que reflete a mudança real do centro de interesses vitais do contribuinte. A análise envolve elementos como: (ii.a) Família: mudança permanente do núcleo familiar para o exterior; (ii.b) Patrimônio: alienação ou manutenção de bens no Brasil e aquisição de ativos no novo país; (ii.c) Negócios: transferência de atividades econômicas e investimentos; (ii.d) Vínculos sociais: residência habitual, laços de convivência e domicílio principal. Mesmo em casos de idas e vindas, a Receita pode reconhecer a residência fiscal no Brasil se identificar que o contribuinte manteve, de fato, seu centro de interesses vitais no país. Assim, a saída fiscal definitiva exige não apenas o cumprimento do prazo de 12 meses, mas também a demonstração inequívoca de que houve ruptura da residência no Brasil e a fixação da vida em outro país.
7. “Esse caráter de permanência pressupõe a intenção de permanência estável e duradoura no exterior, em razão de seu lar, família, emprego, logística ou atividades.”
8. [...] Ao comunicar a saída fiscal ao agente custodiante ou instituição financeira, o contribuinte deve solicitar a readequação de sua conta bancária para a modalidade de conta de investidor não residente, para acomodar seus rendimentos, agora, considerados como capital estrangeiro em reais. Neste momento, o investidor não residente pode optar em manter uma ou as duas modalidades de conta, sendo a diferença, essencialmente, a CNR como uma conta transacional, onde há serviços de banking (pagamento de contas e eventual cartão de crédito) e a Conta 4373 como conta puramente de investimento, onde não há funções de banking, porém há a arquitetura mais aberta de investimentos, e o regime especial de tributação para alguns ativos. (LIBERTUCI, Elisabeth. Manual do Brasileiro no Exterior - Ed. 2025. Artigo: tributação para os não residentes sobre ativos financeiros: seria um caso de “exit tax”?. Luciana Guaspari de Orleans e Bragança; Daniela Vieira Fernandas; Livia Martins Wandick de Souza.. São Paulo (SP):Editora Revista dos Tribunais. 2024. E-book).
Já em relação aos rendimentos provenientes de investimentos em ativos financeiros, variam de acordo com seu tipo de acordo com o regime tributário especialmente destinado às contas 4373 de acordo com o artigo 88 da IN da RFB nº 1582/2015. [...] "Para os ganhos de capital em renda variável, como ações, os investidores não residentes têm isenção de Imposto de Renda Retido na Fonte (“IRRF”) na maioria das operações. Ademais, a instrução também define com clareza as regras para a tributação de ganhos de capital em operações com derivativos e outros instrumentos financeiros complexos, aplicando alíquotas específicas conforme o tipo de ativo, o risco e o prazo da aplicação." (Libertuci, 2024) LIBERTUCI, Elisabeth. Manual do Brasileiro no Exterior - Ed. 2025. Artigo: tributação para os não residentes sobre ativos financeiros: seria um caso de “exit tax”?. Luciana Guaspari de Orleans e Bragança; Daniela Vieira Fernandas; Livia Martins Wandick de Souza.. São Paulo (SP):Editora Revista dos Tribunais. 2024. E-book).
O fluxo de recebimento e envio de recursos no Brasil para o exterior também é bastante simples, por meio do uso das contas 4.373 e CDE, conforme finalidade de cada uma delas. [...] Em razão do objetivo da conta, a prática de mercado é que os valores enviados ao Brasil sejam mantidos por, no mínimo, 30 dias. Mesmo que não exista uma norma específica sobre a observância desse período, este é o entendimento atual das principais instituições financeiras para evitar o abuso de finalidade da conta 4.373 e do benefício fiscal de IOF Câmbio. [...] A conta CDE, conta corrente para as demais transações, permite que o investidor receba câmbios de disponibilidade (remessas que não têm o objetivo de investimento), inclusive de diferentes titularidades. Nesses casos, o IOF Câmbio será de 0,38% [24]. Quaisquer outras remessas, não relacionadas a investimentos no mercado financeiro, deverão ser feitas por meio da conta CDE e estarão sujeitas à tributação pelo IOF Câmbio e Imposto de Renda, conforme a natureza de cada operação. (LIBERTUCI, Elisabeth. Manual do Brasileiro no Exterior - Ed. 2025. Artigo: Tributação e remessa ao exterior. Victória M. V. Tenório de Siqueira. São Paulo (SP):Editora Revista dos Tribunais. 2024. E-book).
9. Isso significa que a sociedade precisará migrar para outro regime de tributação (Lucro Presumido ou Real), o que pode elevar custos e alterar completamente o planejamento societário.
10. Austrália, Nova Zelândia e Irlanda não tem acordo de bitributação com o brasil até o momento (setembro/2025)
Acesso na Página: 09/12/2025